sábado, 4 de fevereiro de 2012

TRÊS CASOS DE VOCAÇÃO – LUCAS 9, 57 -62.


“Aquele que põe a mão no arado e olha para trás não é apto para o Reino de Deus.”

1. Localização da passagem bíblica.

Em Lucas 9, 51, é narrado que ao se aproximar o tempo em que Jesus devia ser arrebatado deste mundo, Ele decidiu ir a Jerusalém. Então, os encontros que vamos refletir agora se dá neste caminhar de Jesus para Jerusalém.

Em verdade, os encontros que temos em nossas vidas acontecem no nosso caminhar, no nosso dia a dia, na escola, no trabalho, na família, na vida em comunidade. Não precisamos de um momento especial, de um dia diferente, para encontrar com o outro e para acolhê-lo e ser por ele acolhido. O encontro se dá no ordinário.

Como diz São Francisco de Assis pregue sempre o evangelho e , se necessário, use palavras. Isto porque a nossa pregação de jovens, jovens inquietos, se dá por intermédio da nossa própria vida, em todos os ambientes que freqüentamos.

O que fez com que as pessoas viessem a Jesus não foi a sua erudição, a sua riqueza, o seu poder, mas sim a sua pessoa, a sua vida, o seu olhar, as suas doces, porém fortes, palavras.

A reflexão ora proposta é centrada no encontro com Jesus, encontro pessoal, amoroso, porém radical. Se a resposta for um sim firme e convicto, como o de Maria, haverá vida e vida em plenitude (Jo 10,10). Por outro lado, a resposta repleta de dúvidas, medos, incertezas faz com que o discípulo não seja apto, como concluiu Jesus no final do texto que será refletido: quem põe a mão no arado e olha para trás não é apto ao Reino de Deus.

As respostas dadas por Jesus nestes encontros que vamos refletir são um tanto quanto enigmáticas, difíceis de entender numa leitura apressada. Contudo, após uma leitura orante da palavra se vislumbra nitidamente que a resposta ao chamado de Deus deve ser feita com coragem, disponibilidade e amor.

2. Primeiro encontro – Lucas 9, 57-58.

Relata a passagem: “Enquanto caminhavam, um homem lhe disse: ‘Senhor, seguir-te-ei para onde quer que vás’. Jesus replicou-lhe: ‘As raposas têm covas e as aves do céu, ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça.”

Neste encontro, nota-se o entusiasmo do discípulo. Ao ver Jesus, ao senti-lo próximo, ele não se conteve e disse que lhe seguiria para onde quer que Ele fosse. Dá até para imaginar o cara, provavelmente um jovem com a sua impetuosidade, berrando para Jesus que iria onde quer que Ele fosse.

Na verdade, Jesus sentiu que aquilo era apenas “fogo de palha”, uma fé fundamentada em sentimentos, na emoção do momento, como ocorre muito hoje; se vou a uma reunião e choro, tremo, canto, me emociono e porque encontrei Jesus, mas se vou e apenas escuto, medito, rezo e partilho parece que ficou faltando algo. A experiência íntima com Jesus deve nos conduzir a uma fé madura, firme, que independe de sentimentos. Tem dia que a gente tá mais alegre, festivo e tem dia que tá mais tristonho, reflexivo, “de bico”, mas a fé é a mesma e assim deve ser.

É interessante notar que Jesus diz que as raposas têm suas covas, os pássaros os seus ninhos, mas que Ele não tem onde reclinar a cabeça. Ou seja, os animais, a vida comum, ordinária, tem a sua segurança própria, natural.

Nós temos a nossa segurança material: a casa, o salário, os estudos, a família, a saúde, a beleza, a juventude. Contudo, sempre haverá a insegurança. Como será o futuro? Passarei no vestibular? Terei dinheiro suficiente? Estarei sadio ou doente? O que é a morte?

Jesus mostra ao discípulo que Ele mesmo não tem onde reclinar a cabeça. Reclinar a cabeça é descansar, é se acalentar, se sentir seguro. A mensagem é clara: não é porque nos encontramos com Jesus que teremos a segurança de que tudo será do jeito que queremos, que tudo dará certo, que vamos prosperar, ganhar dinheiro, ser saudáveis e felizes. Momentos de dificuldade irão acontecer, mas a nossa segurança estará fundamentada na fé de que “todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são os eleitos...” (Rom 8,28)

É bom aqui nos lembrarmos de que o discípulo diz que irá onde Jesus for. Será? Para onde Jesus foi no final de sua estada aqui na Terra? Para a morte e morte de cruz. Será que o discípulo animadinho iria com o mesmo ânimo e entusiasmo para a cruz? No próprio capítulo 9 de Lucas, versículo 23, Jesus diz que quem quer segui-lo deve tomar a sua cruz.

Devemos ter, pois, a consciência de que a nossa resposta ao chamado de Jesus passa pela cruz. Porém, devemos ter a esperança de que o destino não é a cruz, mas a ressurreição, a vida nova que somos convidados a cada dia.

3. Segundo encontro - Lucas 9, 59-60.

Eis como diz a Palavra: “A outro disse: ‘ Segue-me’. Mas ele pediu: ‘Senhor, permite-me ir primeiro enterrar o meu pai.’ Mas Jesus disse-lhe: ‘ Deixa que os mortos enterrem os mortos; tu, porém, vai e anuncia o Reino de Deus.’”

Aqui, diferentemente do encontro anterior, não é o discípulo que corre atrás de Jesus, cheio de ânimo. Este segundo tem um outro perfil. É mais comedido e parece ser até mais responsável. Deus nos chama e acolhe com a nossa personalidade; uns mais alegres, expansivos, atirados, outros mais quietos, tímidos, retraídos.

Porém, cada um tem o seu valor e para todos – daí a igreja ser católica, que significa universal – o chamado, o convite é feito. Santo Agostinho fala bem sobre a individualidade de cada membro da comunidade quando diz: “Deixa que Deus te agrade como és, não como tu quererias que fosse.” (Serm. 9, 8-9).

Este segundo discípulo, que parece ser muito responsável, pede para ir enterrar o seu pai. O seu pedido é corretíssimo. Como bom judeu, este discípulo tinha que “honrar pai e mãe”, que é o quarto mandamento (Ex 20, 12). Ademais, a prática de enterrar os mortos é uma prática que herdamos do judaísmo, sendo, inclusive, uma prática de saúde pública na antiguidade, assim como o de lavar as mãos antes das refeições, como a gente vê em diversas passagens bíblicas.

Então por que Jesus não deixou que o discípulo fizesse o que deveria ser feito, a sua obrigação como um bom e zeloso filho judeu? Em primeiro lugar, Jesus não proibiu o discípulo de enterrar o pai, mesmo porque Jesus não veio para abolir a lei e os profetas, mas sim para levá-los à perfeição (Mt 5, 17).

A mensagem central de Jesus neste ponto é a de que não devemos nos esconder nas obrigações, nos deveres, como desculpa para não anunciarmos o Reino de Deus.

Em primeiro lugar, anunciar o Reino de Deus é viver em perfeição a caridade, que é o vínculo de toda a perfeição. Ter amor a Deus e ao irmão é anunciar a Boa Nova.

Muitas vezes deixamos de acolher o outro, de ouvi-lo, de prestar a atenção, de visitá-lo, de mandar um torpedo, uma mensagem, porque estamos fazendo o que se deve fazer. Não é errado cumprirmos as nossas obrigações diárias, como não era errado o discípulo enterrar o seu pai, mas somos chamados a dar um passo adiante.

Na própria vida em comunidade, vezes há que estamos tão atarefados com a música, a pregação, a liturgia, as reuniões, que esquecemos do outro. Ficamos a enterrar mortos, enquanto o Senhor da Vida, o Ressuscitado, está a nos chamar para uma experiência íntima e verdadeira com Ele e com o próximo.

A mensagem para nós hoje no Inquietude é a de que mesmo com os deveres que temos, com o vestibular, a faculdade, o trabalho, o estágio, a família, o namoro, devemos como Maria, irmã de Marta e de Lázaro, optar pela melhor parte que é ficar próximos de Jesus e da comunidade (Lc 10, 38-42).

4. O terceiro encontro – Lucas 9, 61-62.

O último trecho que vamos meditar é este: “Um outro ainda lhe falou: ‘Senhor, seguir-te-ei, mas permite primeiro que e despeça dos que estão em casa’. Mas Jesus disse-lhe: “Aquele que põe a mão no arado e olha para trás, não é apto para o Reino de Deus.”

Este terceiro discípulo quer seguir Jesus, mostra-se decidido como o primeiro, mas prudente como o segundo. É como se fosse uma mistura dos dois anteriores. A impetuosidade e a responsabilidade juntas.

Ele faz um pedido justo. Quer se despedir dos que estão em casa, antes de seguir a Jesus. Nada de mais, nada de errado. Jesus também não o proíbe.

Todavia, a resposta do Mestre, tanto aqui como no encontro com o segundo discípulo, parece ser ríspida, até um pouco mal educada. De fato, é só impressão, eis que o importante é a mensagem por detrás de tais encontros. O tema central é a conversão firme e sincera.

A frase bastante conhecida diz que quem põe a mão no arado e olha para trás não é apto ao Reino de Deus, ou não é digno de mim, como se lê em outras versões da Bíblia.

Colocar a mão no arado é trabalhar. Jesus vivia numa sociedade agrícola, em que o utensílio arado era de grande importância. Por a mão no arado é começar uma atividade importantíssima, eis que a vida da comunidade dependerá desta atividade que é trabalhar a terra para dela obter o fruto necessário para o sustento.

Igualmente, quando colocamos a mão no arado na comunidade, em particular no Inquietude, o próprio sustento, a própria sobrevivência da comunidade depende da nossa coragem, disponibilidade e amor pelo serviço. Somos chamados a lavrar a terra do Inquietude na música, na animação, na preparação das reuniões, nas ações sociais, nas atividades da Paróquia. Se cada um não fizer a sua parte não haverá o fruto. A comunidade exista porque cada um existe, está aqui e cumpre o seu papel.

Olhar para trás é uma expressão também muito conhecida. Quando houve a destruição de Sodoma e Gomorra, a mulher de Lot ao fugir para outra cidade chamada Segor olhou para trás e acabou virando uma estátua de sal (Gen 19,26).

A ideia central é a de que quem diz sim ao Senhor e começa a trabalhar nesta nova realidade, acreditando que um mundo melhor é possível, não deve olhar para trás. Assim como a mulher de Lot que deveria ter ido para frente, rumo à nova cidade, à nova vida e ao olhar para trás virou sal, nós devemos ir para a nova cidade, a Nova Jerusalém que se encontra no nosso coração. Quem olha para trás vira sal, ou seja, morre, não dá fruto, não dá vida.

Olhar para trás é não deixar de lado coisas que nos impedem de seguir decididamente Jesus. Põe a mão no arado mas continua fazendo coisas que são incompatíveis com essa nova vida, essa nova cidade que Deus nos preparou. Uma vida com ciúme, inveja, ira, orgulho, fofoca, bebedeiras, prostituição, enfim uma vida diferente da proposta de paz, alegria e amor, frutos de uma experiência verdadeira, profunda e duradoura com o Mestre.

5. O meu encontro, a minha resposta.

Após estas reflexões, podemos refletir sobre o nosso encontro com o Mestre. O olhar de Jesus sobre nós. O chamado “Vem e segue-me”. A nossa vontade de ir para onde Ele for, como o primeiro discípulo, vontade esta que esbarra em obstáculos existentes na nossa vida e no nosso interior.

O chamado é para cada um. Cada um tem a sua personalidade, o seu talento, a sua vontade. Há um arado para cada qual. Basta então seguir em frente e não olhar para trás...

Por último, vale sempre ter no coração as sábias palavras de Santo Agostinho: “A procura de Deus é a procura da felicidade. O encontro com Deus é a própria felicidade.”

Leonardo Buissa.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Novembro Inquieto!

Inquietos, chegou o mês do nosso aniversário, onde vamos comemorar um ano de alegrias, diversões, amizades, orações.. enfim, um ano de caminhada juntos! Então, não percam nenhuma reunião do nosso Novembro Inquieto, as quartas-feiras, depois da missa das 19:00 horas, no salão de palestras do Colégio Agostiniano. #01anoINQUIETUDE

"Inquieto,inquieto
Eu tenho um coração inquieto
Cristão nas atitudes
Só Deus acalma nossa Inquietude!"

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

As bem- aventuranças


1. O Sermão da Montanha.
            O que se denomina Sermão da Montanha é um conjunto de ensinamentos de Jesus sobre diversos assuntos. Ele se encontra no Evangelho de Mateus nos capítulos 5 a 7 e no de Lucas no capitulo 6, 20-49.
            Analisando o Evangelho de Mateus, observa-se que, nos versículos 1 e 2 do capítulo 5, é narrado que Jesus, vendo as multidões, sobe à montanha, senta-se com os discípulos que se aproximam dele e abre a boca para ensiná-los.
            Aqui se observa a simplicidade do Mestre, sentando-se com os discípulos, não se colocando na posição de chefe, de autoridade, de pregador. Faz-se igual, animando com a sua presença toda a comunidade. Esta singela abertura de Jesus faz com que os discípulos se aproximem dele. Nós podemos nos assentar com Jesus, nos aproximar Dele que é manso e humilde de coração. Eis a primeira grande verdade do Sermão da Montanha.
            Ainda aqui é importante ver que Jesus abre a boca para ensiná-los. Ensina com simplicidade, porém com autoridade, com força. É o amor verdadeiro, aquele que diz não o que queremos ouvir, mas o que é necessário ser ouvido. Amar, na concepção agostiniana, é fazer o que deve ser feito e o Nosso Senhor fez isto no Sermão da Montanha, abrindo a boca e nos ensinando a ter vida e vida em plenitude.
            Em seu livro  sobre o Sermão da Montanha, Santo Agostinho nos diz que ele contém “todos os preceitos pelos quais é formada a vida cristã.”  Pode-se afirmar que o Sermão da Montanha é o decálogo do cristianismo. Como os dez mandamentos conduziram e conduzem o povo de Israel, os ensinamentos de Jesus na montanha conduzem nós cristãos no caminho da Verdade.
            O Sermão da Montanha possui várias partes como as bem-aventuranças, o sal da terra e a luz do mundo, o paralelo entre a lei antiga e a nova lei,  o mandamento do amor, a esmola, a oração, o Pai Nosso, as preocupações exageradas, o tesouro no céu, a porta estreita, os falsos e verdadeiros discípulos, enfim há uma verdadeira síntese de todos os preceitos da vida daquele que se converte à revolucionária mensagem de amor de Jesus.
            Aqui serão refletidos alguns aspectos das chamadas bem-aventuranças.

2. O que é ser bem aventurado.
            Em Mateus 5, 3-11, Jesus indica nove situações de bem aventuranças. A ideia de bem aventurado está ligada à felicidade, mas não a felicidade que o mundo dá, uma felicidade passageira, da balada, da bebida, do carro potente, da roupa nova,  mas a felicidade que vem do encontro verdadeiro, sincero, radical com Deus. Uma felicidade que chega devagar, sem muito alarde, mas que permanece. Uma felicidade que não depende de momentos felizes, pois a vida é feliz, apesar dos dias de aborrecimento, de raiva, de tristeza até. Uma felicidade natural como respirar...
            Assim, podemos dizer que bem aventurado é um cara feliz. Feliz porque encontrou o céu, o céu que está dentro de si mesmo, como nos ensina Agostinho quando nos exorta a entrar dentro de si mesmo para encontrar a verdade.
            Ser um cara feliz é o convite de Jesus para nós, jovens do Inquietude!

3. Feliz o que tem um coração puro e humilde.
            No versículo 3, o Senhor fala para a multidão que estava em volta dele no monte que bem aventurado é o que tem um coração de pobre e que dele é o Reino do céus.
            Ter um coração de pobre não significa não possuir bens, não desejar um bom emprego, não lutar por um salário digno, por uma casa, um carro, uma poupança, enfim não está Jesus condenando o trabalho humano e a acumulação de riqueza. Ter um coração de pobre é não se apegar exageradamente aos bens, aos objetos, sendo escravo do possuir.
            Santo Agostinho nos ensina que o bem, o objeto não é em si mau. Diz ele que “é evidente ser preciso não censurar o objeto do qual se usa mal, mas sim a pessoa que dele mal serviu.” (O livre-arbítrio). E completa: “quem se serve mal é aquele que se apega a tais bens de maneira a se embaraçar com eles, amando-os demasiadamente. Com efeito, submete-se àqueles mesmos bens que lhe deveriam ser submissos.” (idem)
            A lição do pai de nossa comunidade, o Inquietude, é clara: os bens não são bons ou maus, nós é que podemos fazer bom ou mau uso dos mesmos em nossa vida. Temos vários exemplos na história: o avião, utilizado para encurtar distâncias, foi e é utilizado nas guerras para matar inocentes; a ciência utilizada para a destruição como nas armas nucleares e químicas; a própria religião utilizada para escravizar, para manipular as pessoas, tornando-as cegas, fanáticas, intolerantes.
            Ter um coração de pobre é saber possuir as coisas e utilizá-las corretamente. Não ser possuído pelos objetos, mas sim possui-los. É como canta o Frejat na canção Amor pra recomeçar: “ Desejo!
                                   Que você ganhe dinheiro
                                   Pois é preciso viver também
                                   E que você diga a ele
                                   Pelo menos uma vez
                                   Quem é mesmo
                                   o dono de quem...”

             Ser verdadeiramente humilde e não fingir humildade que, na verdade, é soberba, como ensina Santo Agostinho.
            A promessa para os pobres de coração é o Reino dos céus. Ora, o Reino não é algo distante, ideal. O Reino começa no nosso coração.
             O pobre de Deus tem a serenidade interior tanto nos momentos em que está na bonança, na prosperidade, na riqueza, quanto nos momentos de adversidade, de desemprego, de falta de dinheiro, de perda. Na vitória ou na derrota, sabemos que temos em nós o Reino dos céus.
            Jesus diz também que feliz é o puro e que este verá a Deus (vs. 8). Muita gente liga esta pureza à sexualidade no pressuposto de ser esta impura, o que não é absolutamente verdadeiro. A sexualidade é um presente de Deus para o homem e serve como potente alavanca para a sua plena felicidade, desde que vivida harmoniosamente. A pureza do corpo é importantíssima sim. Somos templos do Espírito de Deus e devemos agir como tal para nos aproximarmos dignamente do Senhor.
            Mas a pureza que Jesus fala não se limita a isso. Eis a pregação do Padre Raniero Cantalamessa, Pregador da Casa Pontifícia: “Na verdade, a pureza de coração não indica, no pensamento de Cristo, uma virtude particular, mas uma qualidade que deve acompanhar todas as virtudes, a fim de que elas sejam de verdade virtudes e não, ao contrário, esplêndidos vícios. Seu contrário não é a impureza, mas a hipocrisia.” E completa: “O que Jesus entende por ‘pureza de coração’ se deduz claramente do contexto do Sermão da Montanha. Segundo o Evangelho, o que decide a pureza ou impureza de uma ação – seja esta a esmola, o jejum ou  a oração – é a intenção; isto é, se realizada para ser vistos pelos homens ou para agradar a Deus.” (“Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus”, Primeira pregação da Quaresma).
            Ser puro é fazer as coisas sem fingimento, sem hipocrisia. É desejar agradar a Deus, é amar de verdade, é utilizar os dons, os carismas para a edificação da comunidade e não para o envaidecimento. O maior dom, o carisma superior é o amor (ICor 12, 31).
            Nós, do Inquietude, devemos ser puros na oração, na animação, na música, nas visitas aos necessitados, nas relações com os irmãos de comunidade e, principalmente, com a família.
            Quem é puro, quem é verdadeiro, quem vem para a luz, consegue ver a face de Deus. O evangelho de João nos exorta: “...todo aquele que faz o mal odeia a luz e não vem para a luz, para que suas obras não sejam reprovadas. Mas aquele que pratica a verdade, vem para a luz. Torna-se assim claro que as suas obras são feitas em Deus.” (JO 3, 20-21).
            Puros e humildes podemos nos encontrar com Deus!

4. Feliz o que chora e que tem fome e sede de justiça.
            No versículo 4, Jesus ensina que bem aventurados os que choram, pois serão consolados.
            Como pode ser bem aventurado, ser feliz, ser bendito o que chora? Parece uma contradição. Mas não é absolutamente. Primeiro porque a presença de Deus na nossa vida não depende do nosso estado de ânimo. Estou feliz, alegre, contente vou ao Inquietude cantar, louvar, aprender. Estou triste, fico em casa amargurado...
            O Pai amoroso está de braços abertos tanto para o triste filho que sumiu no mundo, quanto para o filho fiel que ficou ao seu lado na parábola do Filho Pródigo. Esta a certeza da nossa fé. Ainda que se chore, tem-se a certeza da consolação, da presença amorosa do Pai, do filho, nosso amigo de caminhada, Jesus e do seu Santo Espírito a nos conduzir. A comunidade da Santíssima Trindade está sempre conosco.
            E muitas vezes choramos, nos irritamos, porque temos fome e sede de justiça. A nossa alma tem sede, o nosso corpo tem fome de justiça. Não acostumamos com a injustiça e nem podemos nos acostumar.
            A inquietude agostiniana nos leva a não nos conformar com coisas erradas e a sonhar juntos, em comunidade, que outro mundo é possível. E a promessa de Jesus para nós é de que nós seremos saciados, ou seja, de que o nosso trabalho na comunidade não é em vão, que estamos construindo um mundo melhor.
            Eis como canta Lulu Santos no rock Tempos Modernos:
            Eu vejo um novo começo de era
            De gente fina, elegante e sincera
            Com habilidade
            Pra dizer mais sim
            Do que não, não, não...
           
            Podemos lutar para mudar muita coisa em nossa volta. Algumas conseguiremos, outras talvez não. Mas não esqueçamos da oração de São Francisco de Assis:
           
            “Senhor, dai-me força para mudar o que pode ser mudado...
            Resignação para aceitar o que não pode ser mudado...
            E sabedoria para distinguir uma coisa da outra.”     

5. Feliz o manso, o misericordioso e o pacífico.
            Os mansos possuirão a terra. Os misericordiosos alcançarão misericórdia. Os pacíficos serão chamados de filhos de Deus (Mt 5, 5, 7 e 9).
            Jesus nos conclama a sermos mansos, misericordiosos e pacíficos e com isso teremos a terra e o céu. A terra no dia a dia e o céu na misericórdia do nosso Pai, pois seremos chamados filhos.
            O cuidado com o outro em todos os lugares; em casa, na escola, no trabalho, no Inquietude, no trânsito, no esporte, nas festas, no namoro, enfim em todos os momentos somos convocados a ser manso, pacíficos e tratar o próximo com misericórdia, com compaixão, com respeito. Os nossos gestos, as nossas palavras, a nossa conduta diária indica se estamos efetivamente vivendo esta bem aventurança.
            O próximo que são os pais, os irmãos, os amigos, os colegas, a (o) namorada (o), o diferente, que não comunga das suas ideias, convicções e até nos critica.
            Dia 04 de outubro foi dia de São Francisco de Assis, modelo de mansidão, de paz, de simplicidade, aliás modelo de bem-aventurado. Francisco de Assis nos diz que a cortesia é irmã da caridade, que apaga o ódio e fomenta o amor.
           
6. Feliz o perseguido por causa da justiça.
            Jesus na parte final das bem aventuranças exorta que o perseguido por causa da justiça e os caluniado é bem aventurado também. Para este a promessa é o Reino de Deus.
            Cumpre notar que o Mestre fala de perseguido por causa da justiça. Assim, temos sede e fome de justiça, não nos acostumamos com a injustiça e mesmo assim podemos ser perseguidos por conta deste nosso ideal. A mensagem é dura e faz parte da radicalidade cristã.
            O cristão verdadeiro é radical. Não no sentido de ser intransigente, intolerante, mas sim no sentido de ter raiz que nos firma no solo e não nos permite ficar mudando de posição ao sabor dos ventos. Somos árvores, embora possamos ser maleáveis, como o bambu, não podemos ficar saindo daqui e indo acolá. Devemos permanecer fixos na nossa opção de vida e vida em plenitude, ainda que isto nos custe algumas criticas injustas.
            Bem aventurado o perseguido e caluniado por causa da justiça. É por uma boa causa. Não é bem aventurado quem é perseguido por que fez algo errado, porque praticou a injustiça. Aí ele está respondendo apenas pelas conseqüências dos seus atos. Simples assim.
            Não se deve utilizar estes versículos para justificar o injustificável e nem para se ter uma posição de coitadinho. Quando fazemos algo bom, somos dignos de elogio; quando algo ruim advém de nós, somos objeto de perseguição. Mas pode acontecer de estarmos fazendo o bem e ainda assim ser perseguido. O Senhor nos chama a não termos medo e mantermos a nossa autenticidade de jovens santos.

7. Alegrai-vos.
            No final, o Senhor nos chama a alegrar, a exultar porque, ao sermos bem aventurados, teremos uma grande recompensa: o céu, que é uma vida plena em paz, alegria e amor!
           
            Leonardo Buissa
           


domingo, 25 de setembro de 2011


Precisamos de Santos
“Precisamos de santos sem véu ou batina.
Precisamos de santos de calças jeans e tênis.
Precisamos de santos que vão ao cinema, ouvem música e passeiam com amigos.
Precisamos de santos que coloquem Deus em primeiro lugar e que se “lascam” na faculdade.
Precisamos de santos que tenham tempo diário para a oração e que saibam namorar na pureza e castidade, ou que consagrem sua castidade.
Precisamos de santos modernos, santos do século XXI, com uma espiritualidade inserida em nosso tempo.
Precisamos de santos comprometidos com os pobres e com as necessárias mudanças sociais.
Precisamos de santos que vivam no mundo, que se santifiquem no mundo, que não tenham medo de viver no mundo.
Precisamos de santos que bebam coca-cola e comam hot dog, que usem jeans, que sejam internautas.
Precisamos de santos que amem apaixonadamente a Eucaristia e que não tenham vergonha de comer uma pizza nos fim-de-semana com os amigos.
Precisamos de santos que gostem de cinema, de teatro, de música, de dança.
Precisamos de santos sociáveis, abertos, normais, amigos, alegres, companheiros.”
Papa João Paulo II

quarta-feira, 21 de setembro de 2011